Fragmentos: Dentro da noite veloz - Ferreira Gullar

A vida muda como a cor dos frutos lentamente e para sempre. A vida muda como a flor em fruto velozmente.
A vida muda como a água em folhas o sonho em luz elétrica a rosa desembrulha do carbono o pássaro da boca mas quando for tempo.
E é tempo todo o tempo mas não basta um século para fazer a pétala que um só minuto faz ou não mas a vida muda a vida muda o morto em multidão.


27 de ago. de 2006

Farra de cargos na Câmara

Correio Brazilense - 27/08/2006
Filhos, mulheres e fantasmas

Familiares empregados por deputados e até por um ex-parlamentar na Câmara sequer freqüentam o local de trabalho. Despesa anual com essa turma, só em salários-base, ultrapassa os R$ 100 mil
Helayne Boaventura e Fabíola Góis Da equipe do Correio

Há na Câmara um grupo especial de funcionários. Eles foram contratados sem concurso e não pisam na Casa nem para assinar a folha de ponto. São servidores fantasmas. Após denúncia do Correio, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), exonerou na semana passada três servidoras nessa situação. Existem, porém, mais fantasmas na lista de servidores. E com uma característica particular: têm sobrenomes famosos. São parentes dos deputados, indicados para os postos pelos próprios parlamentares. Levantamento do Correio revela que pelo menos 11 deputados e um ex-deputado contrataram servidores para a Câmara de forma, no mínimo, inusitada.Três deles não trabalham na Casa. São fantasmas, que só prestam serviço no papel. Mas seus salários são pagos regularmente. Um custo de R$ 8.079 por mês, ou R$ 105.030 por ano.

Oficialmente, Clarissa Cabral Trinta, filha do deputado Remi Trinta (PL-MA), foi contratada para a diretoria legislativa da Câmara. Os registros mostram que ela foi cedida para a Liderança do PL, partido ao qual o pai está filiado. Clarissa recebe R$ 2.388, o equivalente a um cargo de natureza especial (CNE) 14. Procurada, Clarissa não foi encontrada nem na Diretoria Legislativa nem na Liderança do PL. Isso porque ela trabalha há exatos 2.223 quilômetros de Brasília, em Palmeirândia, uma cidade do Maranhão a 66 quilômetros de São Luís. É dentista e dirige o Hospital Municipal do município. Está na função há cerca de três meses. Todos no hospital a conhecem e sabem que ela é filha do deputado Remi Trinta. Antes disso, ela trabalhou por pelo menos um ano em outra cidade do interior maranhense, São Bento. Ou seja, há quase um ano e meio ela está impedida de trabalhar na Câmara. Mas seu nome consta como servidora da Casa e o salário cai na conta todo mês. Sem explicação Na liderança do PL, informaram inicialmente que Clarissa estava em férias. Mais tarde, a assessoria do partido avisou que ela foi dispensada da função. Flagrados, pelo menos 20 deputados pediram a exoneração de seus apadrinhados na última semana.

Situação semelhante é de Ana Beatriz Cunha e Silva Lins. Filha do deputado Átila Lins (PMDB-AM), é beneficiária de uma remuneração de R$ 3.904 (CNE 11). O Correio procurou por ela na Diretoria-Geral da Câmara, a lotação oficial, e na Primeira Vice-Presidência, para onde ela teria sido cedida. Funcionários dizem que ela não trabalha em nenhum dos locais. O deputado Átila Lins não aceitou falar à reportagem.

Ninguém conhece também Wandecy Gabriel de Brito, filho do ex-deputado Nilson Gibson, nos locais onde ele deveria estar trabalhando. Wandecy recebe salário de R$ 1.952 (CNE 15) da Coordenação de Registro Funcional. Estaria cedido para a Comissão de Educação e Cultura. Nos dois locais, os funcionários nem conhecem o rapaz. Além dos fantasmas, há parentes de deputados em situação flagrantemente irregular. José Nilson Santiago Segundo, primo do líder do PMDB na Câmara, Wilson Santiago (PB), é contratado da Câmara. Recebe salário de R$ 2.388. Mas não pisa em Brasília. Trabalha no gabinete do deputado em João Pessoa. As funcionárias do escritório no estado garantiram que José Nilson trabalha efetivamente. Mas que ele não poderia ser localizado porque “fazia campanha” para o deputado no interior do estado. Procurado, o deputado não retornou a ligação.
Irmão do deputado Carlos William (PMDB-MG), Ary de Souza Júnior até trabalha no gabinete. Mas não cumpre horário. Os colegas não sabem dizer qual é a função dele e quando ele pode ser encontrado no local. O deputado confirma a situação. “Ele trabalha. É assessor em tudo. Ele não tem trabalho específico. Pode fazer a qualquer horário e momento”, argumenta. Ausentes Às vésperas da campanha eleitoral, o Correio conseguiu localizar nos gabinetes apenas dois dos parentes de deputados e de um ex-deputado. As explicações para as ausências foram as mais variadas. Odimércia Araújo Costa Reis Sá, mulher do deputado B.Sá (PSB-PI), não estava no gabinete na quinta e sexta-feiras passadas. Estaria acompanhando uma irmã a uma cirurgia no hospital.
A filha do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), Andressa de Azambuja Alves, é uma funcionária pouco conhecida dos colegas. Ela foi procurada na Liderança do PMDB, onde dados da Câmara apontam como seu local de trabalho. Parte dos funcionários disse não conhecê-la. Outros disseram que ela estava em férias.
Thiago de Carvalho de Freitas, filho do deputado Ricarte de Freitas (PTB-MT), também não foi encontrado no gabinete. Os funcionários informaram que ele estava em recesso na semana passada. Apenas a filha do deputado Osvaldo Reis (PMDB-TO), Denise Souza Reis, e a sobrinha do deputado Homero Barreto (PTB-TO), Isolda Eline Barreto Nunes, foram encontradas no final da semana passada. Denise reconhece que o pai é o responsável por sua contratação. “Ele intercedeu, é um cargo de confiança. Mas trabalho”, argumenta. Já Isolda diz que o tio não teve qualquer participação em sua contratação pela Casa. “Estou na Câmara desde 1995. Não tenho vínculo com ele. Ele foi eleito apenas em 2003 pelo Tocantins. Minha vida sempre foi em Brasília”, justifica.

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