Fragmentos: Dentro da noite veloz - Ferreira Gullar

A vida muda como a cor dos frutos lentamente e para sempre. A vida muda como a flor em fruto velozmente.
A vida muda como a água em folhas o sonho em luz elétrica a rosa desembrulha do carbono o pássaro da boca mas quando for tempo.
E é tempo todo o tempo mas não basta um século para fazer a pétala que um só minuto faz ou não mas a vida muda a vida muda o morto em multidão.


20 de set. de 2006

Bode Expiatório

Eliane Cantanhêde - Folha Online - 20/09/2006

Lula escala "culpado"

O governo recorreu a uma estratégia óbvia e que não é nenhuma novidade: tirou do Planalto e jogou para o PT a culpa pela compra de um dossiê contra tucanos pela bagatela de R$ 1,7 milhão. Lula mantém o poder, mas transforma o PT na sua Geni (aquela da música do Chico Buarque).
Mantém-se, assim, o mesmo script de todos os escândalos que têm aparecido no atual governo, e que não são poucos: o Planalto leva um susto, Lula fica indignado, um ministro é escalado para falar em "armação", Márcio Thomaz Bastos entra em ação para reduzir danos e a culpa acaba sempre nas costas do partido.
No final, Lula vai amontoando cadáveres: José Dirceu, Antonio Palocci, José Genoino, Waldomiro Diniz, Delúbio Soares, Sílvio Pereira, aos quais vêm se somar, agora, Freud Godoy, que trabalha há 16 anos com Lula e com o PT, tem gabinete no Palácio do Planalto e função na campanha da reeleição, e Jorge Lorenzetti, petista desde criancinha e também linha de frente do comitê.
A diferença entre Freud e Lorenzetti é justamente o gabinete. Então, Lula, Tarso Genro, Mercadante, Ricardo Berzoini e todos os lulistas criam a tese de que Freud, na verdade, não teve nada a ver. Foi um pequeno equívoco. Quem estava metido com a compra do dossiê era mesmo o Lorenzetti. Porque um, Freud, é Lula, de Lula, de dentro do Planalto. E o outro, Lorenzetti, é PT, do PT e fora do Planalto. Então, pau no Lorenzetti e pau no PT.
Encontrado o culpado de plantão, agora é rezar para não ter que encontrar os chefes. Porque, senão, coitado do Berzoini, ou coitado do Gilberto Carvalho, secretário particular de Lula e, em tese, chefe direto de Freud no Planalto. A cabeça de um dos dois, ou dos dois, terá que ser dada de bandeja para salvar a pele do chefe Lula.
Completado o círculo, é só manter a mesma ladainha do complô das elites: da oposição, da imprensa, dos ricos. Só não dá para citar a Febraban, que essa não acha nada demais na compra de dossiês contra adversários, desde que os lucros bancários continuem como estão - na estratosfera.
É assim que a eleição passa, as pesquisas vão confirmando o favoritismo de Lula já no primeiro turno e nada muda. Só tem um detalhe. Essa história toda não acaba em primeiro de outubro e, se Lula vencer, já vai começar o segundo mandato com a classe média de cara virada, formadores de opinião enojados e um monte de cadáveres que, na verdade, não são cadáveres. São mortos-vivos. E estes sempre aparecem. Para assombrar.

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